Por: Geraldo Lino.

Entre 18 e 23 de março, Brasília recebeu a oitava edição do Fórum Mundial da Água, evento organizado a cada três anos pelo Conselho Mundial da Água (WWC, na sigla em inglês). Por mais que os seus organizadores quisessem desviar o argumento, é evidente que o objetivo central do evento, como é o do WWC, foi popularizar o conceito da privatização dos recursos hídricos, ou, para usar um termo preferido, a sua correta “precificação”.

Não poderia ser diferente. O WWC é uma entidade privada com sede em Marselha, França, fundada em 1996, que reúne grandes empresas privadas como a Suez Lyonnaise des Eaux, Nestlé, Coca-cola e outras, a Federação Internacional de Operadores de Água Privados (AquaFed), organismos internacionais como o Banco Mundial, Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e Organização das Nações Unidas para a Ciência, Cultura e Educação (UNESCO), órgãos governamentais nacionais (inclusive vários brasileiros), Associação Internacional de Água (IWA), ONGs ambientalistas (União Internacional para a Conservação da Natureza – UICN) e outras, num total superiora a 300.

A sua missão declarada, como consta do seu sítio, é “mobilizar ações sobre temas críticos de água em todos os níveis, incluindo os níveis decisórios mais elevados, engajando pessoas no debate e desafiando o pensamento convencional. O Conselho se concentra nas dimensões políticas da segurança, adaptação e sustentabilidade hídrica”

Por isso, grande parte das discussões no Fórum foi centrada no tema do estabelecimento de “preços realistas” para o fornecimento de água. Um relatório da OCDE sobre o assunto afirma que a água é geralmente “subvalorizada” e não apropriadamente calculada nos investimentos, o que afeta as avaliações sobre a viabilidade de projetos e investimentos (Valor Econômico, 21/03/2018).

Outro enfoque que tem concentrado debates em relação ao assunto é o da “escassez” física da água, na berlinda devido aos problemas de abastecimento gerado por secas, em países como no Brasil e a África do Sul, onde a Cidade do Cabo (Capetown) ganhou manchetes mundiais ao anunciar a iminência do “Dia Zero”, previsto para abril, em que ficará completamente sem água.

Na verdade, a despeito não se desconsiderar os impactos das oscilações climáticas, do desmatamento e da ocupação física descontrolada na disponibilidade de água, o problema é muito mais de gestão dos recursos hídricos do que de, propriamente, escassez física. Em especial, o controle da poluição dos corpos líquidos, cujos principais agentes poluidores são os esgotos sem tratamento. Em outras palavras, as deficiências de saneamento básico, que afetam mais da metade da população mundial e da brasileira (e, no Brasil, apenas 44% dos esgotos recebem algum tratamento).

“No caso do Brasil, a maior parte do país, a quantidade de água não é necessariamente o nosso principal problema, e sim, cada vez mais, a questão de repartição dos usos e da qualidade da água”, disse a arquiteta e urbanista Marussia Whately, coordenadora da Aliança pelas Águas, entidade que reúne 70 organizações paulistas, criada por ocasião da crise de abastecimento no estado (Agência Brasil, 24/02/2018).

Em entrevista ao Jornal do Brasil (22/03/2018), o chefe do Laboratório de Hidrologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Paulo Canedo, reforçou: “No Brasil inteiro, o inimigo número um da população é a poluição hídrica. Nossos rios estão muito poluídos. Se eu fosse administrador público, só me preocuparia com isso. É muito grave.”

No Globo (22/03/2018), o próprio presidente do WWC, o brasileiro Benedito Braga, afirmou que o saneamento deve ser prioritário:

(…) A Organização Mundial de Saúde diz que, para cada real investido, a economia é de R$ 4 no setor de saúde pública. As doenças de veiculação hídrica são as que afetam principalmente as crianças, que tomam água contaminada e passam a ter doenças, como diarreia, que eventualmente podem chegar ao óbito. Saneamento significa saúde.

“Na parte de saneamento, infelizmente, a gente avançou muito menos do que seria o desejável, é uma área urgente para o Brasil, da maior importância, uma das nossas maiores deficiências em termos de serviços e que teve não só muitos avanços aquém do esperado do ponto de vista da infraestrutura, mas que tem tendências de sofrer grandes retrocessos do ponto de vista de gestão”, lamentou Marussia Whately.

O enfrentamento do problema, seguramente, ganharia força se as ONGs ambientalistas lhe dessem o destaque merecido como o principal problema ambiental real do País e do planeta.

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